From the series HABITABLE ROOMS
translated by Idra Novey and the author
On Mamma Andersson’s paintings
III.
In the Waiting Room
Light poured
in the room like a rock
and water landscape
in the sunfall of a day like this,
without alternatives. You foresee
what’s about to happen, pale
and diagonally. The objects
exposed on an improvised plane,
behind glass—bird bones,
small instruments, fractured
but useful—left there
provisionally, too close—
one of them within reach
on the table, touching the vertex
of a yellow draft, only
half visible—the rest
left nocturne black, while the stream
of transparent light
leaks into the imminent gray:
the waiting room.
Da série QUARTOS HABITÁVEIS
Sobre telas de Mamma Andersson
III.
Na Sala de Espera
A claridade derramada
no quarto, como um rasgo—
paisagem de água e pedra
no sol de um dia igual a este,
sem alternativas. Você pressente
o que está para acontecer,
pálida e diagonal. Os objetos
expostos num plano improvisado,
atrás da vidraça—ossos de ave,
pequenos instrumentos fraturados,
úteis—provisoriamente
esquecidos ali, perto demais—
um deles ao seu alcance
sobre a mesinha, tocando o vértice
de um esboço amarelo, apenas
a metade visível—todo o resto
é preto noturno, enquanto o riacho
de luz transparente
atravessa a iminência parda
da sala de espera.
City of Bridges
Five stems down from the dead rose, the Mexican gardener told me when we bought the rosebush. An angular, clean cut. The scissors loose in my glove, unmarked, aseptic, smelling of rubber. The self-important stems fall to the ground, aborted from their yellow future.
The cats step outside for the first time. Inconceivable freedom. Never before have they had the possibility to kill, to vanish. The crows are reality, temperature, foliage. The bluebird on the windowsill on one of the first mornings, its long black beak, seems impossible. But it’s there.
Scratches on the wood as on an old document. Nails, cables, hooks, and shadows. The cabinets are too small to validate our desire for change. The heavy drawers in the kitchen once contained someone’s winter potatoes. Lead underneath layers of paint.
Look how we’ve grown, how our hair doesn’t get so wavy in the cold, how the porch is large enough for a pool in the summer. Photos, clippings, combinations. The green is greener, the red less shiny. To choose is to hide. To edit, to lie.
Tomorrow we’re headed to the park. To picnic: the intuition of a far away life in the open, a possibility. The woman who pushes a stroller past the deli department in the supermarket knows something I don’t. And the fruit will still be fresh tomorrow.
On the sidewalk, on a busy street, a mini-installation: a small hobby horse, tiny as a fairy, tied to a rusty ring near the curb, a souvenir transposed from another century. Two people exchange a look, say something about horses, cross the portal of time at the next green light.
Crossing a bridge, following along a stream, into a valley, taking trails to fields of grapes and chemistry, or stepping on the rough sand of a freezing stone landscape. Encrusted in the mountain, a waterfall hypnotizes, distracts its visitors. A thin child in a bathing suit builds a castle on the hot, soft sand.
Two rivers run through the city, as in the other city where we lived. But these two rivers sing. They make you listen. When we go back, some day, I may hear the lament of the rivers in the other city. There are trains, too, tracks to the East and West and deafening.
Moss on the trunks of pine trees, the forest is continually damp, suspended. The thin asphalt gleams of lost roads—all with the option of returning. The middle of nowhere has a precise scent, calculated in maps. It’s possible to hike the trail in exactly two hours and fifteen minutes. Transcendent, in the slender fog.
It was supposed to be raining, but the sun, bright, lights up the street, wind on the branches at the end of autumn, on bamboo trees that form a natural, permanent wall. Few things are permanent. The green will come back in a few months, vivid, beneath a more liquid and orange light.
Cidade das Pontes
Cinco galhos a partir da rosa morta. A jardineira mexicana me disse quando compramos a roseira. Um corte angular e rente. A tesoura meio solta na luva sem marcas de uso, asséptica, com cheiro de borracha. Os galhos túrgidos caem no chão, abortados do futuro amarelo.
Os gatos saíram pela primeira vez. Liberdade inconcebível. Nunca antes a possibilidade de matar, de sumir. Os corvos são a realidade, a temperatura, a folhagem. O azulão no parapeito da janela, numa das primeiras manhãs, o bico negro comprido, parece impossível. Mas está ali.
Os frisos na madeira como um documento antigo. Pregos, cabos, ganchos, sombras. Os armá rios pequenos demais para validar a nossa ansiedade por transformação. As gavetas pesadas na cozinha um dia estocaram batatas no inverno. Chumbo debaixo das camadas de tinta.
Veja como crescemos, como nossos cabelos estão menos ondulados no frio, como a varanda é grande o suficiente para uma piscina no verão. Fotos, recortes, combinações. O verde é mais verde, o vermelho, menos vivo. Escolher é ocultar. Editar é mentir.
Amanhã iremos ao parque. Como se faz um piquenique: a intuição de uma vida distante em aberto, como uma possibilidade. A mulher que empurra um carrinho de bebê na seção de frios do supermercado sabe de algo que eu não sei. E as frutas da estação continuarão frescas amanhã.
Na calçada, na rua movimentada, uma mini-instalação: um cavalinho de brinquedo, minúsculo como uma fada, amarrado a uma argola enferrujada fincada no meio-fio, souvenir transposto de um outro século. Duas pessoas se olham, dizem algo sobre cavalos, atravessam o portal do tempo, farol aberto.
Cruzar a ponte, acompanhar um córrego, descer um vale, seguir trilhas para um campo de uvas e química, ou pisar na areia grossa numa paisagem gelada de rochas. Incrustada na montanha, a cachoeira hipnotiza, desvia. Uma criança de shorts constrói um castelo na areia macia e quente.
Dois rios cortam a cidade, como cortavam a outra cidade onde morávamos. Mas estes rios cantam. Estes rios se fazem escutar. Quanto voltarmos, um dia, talvez eu escute as lamentações dos rios na outra cidade. Também há os trens, os trilhos ao leste, ao oeste, ensurdecedores.
Musgo nos troncos dos pinheiros, umidade constante na floresta, suspensa no ar. Brilho no asfalto fino das estradas perdidas—todas com opção de retorno. O meio do nada tem um cheiro preciso, calculado em mapas. Trilha percorrida em exatamente duas horas e quinze minutos. Transcendente, na névoa escassa.
Era para estar chovendo, mas o sol, radiante, ilumina a rua, vento nos galhos no fim do outono, nos arbustos de bambu que formam um muro natural, permanente. Poucas coisas são permanentes. O verde retornará daqui a alguns meses, vibrante, sob uma luz menos angular e alaranjada.
Translator: Idra Novey is the author of Exit, Civilian, selected by Patricia Smith for the National Poetry Series and a Best Book of 2012 by Cold Front Magazine and The Volta. She is also the author of The Next, Country (Alice James Books, 2008), a finalist for the ForeWord Book of the Year Award in poetry. Her poems have been featured on NPR’s All Things Considered, in Poetry, the Paris Review, Slate, and elsewhere. Her most recent translation is Clarice Lispector’s novel The Passion According to G.H. (New Directions and Penguin UK, 2012). She currently teaches in the Creative Writing Program at Princeton University.